terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

ESTÁ CONSUMADO!

 “Quando Jesus tomou o vinagre, disse: Está consumado. E, inclinando a cabeça, entregou o espírito” — João 19:30. Quão terrivelmente estas benditas palavras de Cristo têm sido mal-entendidas, mal-apropriadas e mal-aplicadas! Quantos parecem pensar que, sobre a cruz, o Senhor realizou uma obra que torna desnecessário que os beneficiários dela viva vidas santas sobre a terra. Muitos têm sido enganados com o pensamento de que, até onde diz respeito o se alcançar o céu, não importa como eles andem, desde que eles estejam “descansando sobre a obra consumada de Cristo”. Eles podem ser infrutíferos, desonestos, desobedientes, todavia, conquanto que eles repudiem toda justiça própria e tenham fé em Cristo, eles imaginam que estão “eternamente seguros”. Ao redor de todos nós há pessoas que são mundanas, amantes do dinheiro, buscadores-do-prazer, quebradores do Dia do Senhor, mas que pensam que tudo está bem com elas, pois “aceitaram a Cristo como seu Salvador pessoal”. Em sua aspiração, conversação e recreação, não há praticamente nada que os diferencie daqueles que não fazem nenhuma profissão de fé. Nem em sua vida familiar ou social há algo, exceto pretensões vazias, para distingui-los dos outros. O temor de Deus não está sobre eles, os mandamentos de Deus não têm autoridade sobre eles, a santidade de Deus não os atrai. “Está consumado”. Quão solene é perceber que estas palavras de Cristo devem ter sido usadas para tranqüilizar milhares com uma falsa paz. Todavia, tal é o caso. Nós temos tido contato próximo com pessoas que não têm nenhuma vida de oração privada, que são egoístas, cobiçosas, desonestas, mas que supõem que um Deus misericordioso fará vistas grossas para tais coisas, desde que eles tenham alguma vez colocado sua confiança no Senhor Jesus. Que horrível perversão da verdade! Que transformação da graça de Deus “em libertinagem”! (Judas 4). Sim, aqueles que agora vivem as vidas mais egoístas e agradáveis à carne, falam sobre sua fé no sangue do Cordeiro, e supõem que estão salvos. Como o diabo os tem enganado! “Está consumado”. Estas benditas palavras significam que Cristo satisfez de tal forma o requerimento da santidade de Deus, que mais nenhuma santidade tem qualquer reivindicação real e premente sobre nós? Deus não o permita pensarmos tal! Até mesmo para o redimido Deus diz: “Sede santos, assim como Eu sou Santo” (1 Pedro 1:6). Cristo “magnificou a lei e a fez honrosa” (Isaías 42:21), para que pudéssemos ficar sem lei? Ele “cumpriu toda justiça” (Mateus 3:15) para comprar para nós uma isenção de amar a Deus com todo o nosso coração e servi-Lo com todas as nossas faculdades? Cristo morreu para assegurar uma divina indulgência, para que pudéssemos viver para agradar a nós mesmos? Muitos parecem pensar assim. Não, o Senhor Jesus deixou ao Seu povo um exemplo para que eles pudessem “seguir (não ignorar) os Seus passos”. “Está consumado”. O que está “consumado”? A necessidade dos pecadores se arrependerem? Deveras não. A necessidade de se voltar dos ídolos para Deus? Deveras não. A necessidade de mortificar os meus membros que estão sobre a terra? Deveras não. A necessidade de ser santificado completamente, no espírito, alma e corpo? Deveras não. Cristo não morreu para fazer minha tristeza, meu ódio e o meu empenho contra o pecado desnecessários. Cristo não morreu para me absolver de todas as minhas responsabilidades diante de Deus. Cristo não morreu para que eu pudesse continuar retendo a amizade e comunhão do mundo. Quão extremamente estranho é que alguém possa pensar que Ele tenha feito isso. Todavia, as ações de muitos mostram que esta é a sua idéia. “Está consumado”. O que está “consumado”? Os tipos sacrificiais foram consumados, as profecias de Seus sofrimentos foram cumpridas, a obra dada a Ele pelo Pai foi perfeitamente realizada, um fundamento certo foi posto, no qual um Deus justo pode perdoar o mais vil transgressor da lei que jogou as armas de sua guerra contra Ele. Cristo já realizou tudo o que era necessário para que o Espírito Santo viesse e operasse nos corações do Seu povo; convencendo-lhes de sua rebelião, destruindo sua inimizade contra Deus, e produzindo neles um coração amoroso e obediente. Oh, querido leitor, não cometa engano neste ponto. A “obra consumada de Cristo” não lhe beneficia em nada, se o seu coração nunca foi quebrantado através de uma consciência agonizante de sua pecaminosidade. A “obra consumada de Cristo” não lhe beneficia em nada, a menos que você tenha sido salvo do poder e da poluição do pecado (Mateus 1:21). Ela não lhe beneficia em nada, se você ainda ama o mundo (1 João 2:15). Ela não lhe beneficia em nada, a menos que você seja uma “nova criatura” nEle (2 Coríntios 5:17). Se você valoriza sua alma, examine as Escrituras para ver por si mesmo; não tome nenhuma palavra de homem no lugar disso. apologetica.perguntas@hotmail.com

A DINVINDADE DE CRISTO

Nós cremos que o Senhor Jesus Cristo, como a segunda Pessoa da Deidade Triuna, é Deus, sempre foi Deus, e sempre será Deus. A Bíblia declara explicitamente que Jesus é Deus (Isaías 9:6; Mateus 1:23; João 1:1; 20:28; Atos 20:28; Romanos 9:5; Filipenses 2:6; I Timóteo 3:16; Tito 2:13; Hebreus 1:8; I João 5:20). Em nossa opinião, não é mera coincidência que a maioria das traduções modernas das Sagradas Escrituras (e.g., the RSV, NASV e NIV) mudaram ou lançaram uma dúvida desnecessária sobre muitos desses versos-chaves da Bíblia. Os religiosos liberais não crêem na divindade eterna ou na deidade eterna do Senhor Jesus Cristo. Pelo contrário, eles O consideram simplesmente como um homem, um religioso devoto, através de quem Deus operou de uma forma única, como um grande professor ou profeta, como um mártir totalmente comprometido, ou como um modelo que foi colocado diante do resto da raça humana em Seu desenvolvimento evolucionário. Embora estes liberais estejam dispostos a “tirar o chapéu” para Jesus, eles não estão tão disposto a se encurvarem diante dEle e adorá-Lo como o Deus Todo-Poderoso. Ernest Pickering faz uma advertência oportuna aos cristãos que vivem durante esta era laodiceiana de apostasia, quando escreve: “Até tempos recentes, quase todos os cristãos ortodoxos sustentavam a doutrina da divindade de Cristo. Desafortunadamente, a igreja experimentou dias maus e agora, muitos púlpitos estão ocupados por homens que negam esta verdade bíblica tão importante e básica. Líderes religiosos não tomam mais seriamente a evidência bíblica da divindade de Cristo. Alguns pregadores e professores incrédulos, contudo, nem sempre se expressam tão claramente como outros. Eles preferem falar de maneira dúbia. Alguns pregadores modernos liberais declaram que eles crêem que Jesus Cristo é Deus; mas, se você entender sua linguagem, perceberá que eles não querem dizer o que a Bíblia diz. Os cristãos precisam desenvolver um discernimento espiritual agudo, para que eles não sejam enganados por qualquer um que reivindique crer na divindade de Jesus Cristo”. Os religiosos liberais crêem num outro Jesus, e não naquele Jesus revelado na Santa Escritura (João 8:23-24; II Coríntios 11:3-4; Gálatas 1:6-9; I João 4:1-3; II João 7-11) . O Jesus no qual eles crêem nunca existiu na história humana, mas é o produto de suas imaginações ímpias e uma invenção de suas mentes e corações depravados. Os religiosos liberais não podem ser considerados cristãos no sentido bíblico da palavra. Os verdadeiros cristãos crêem no Jesus da Bíblia apologetica.perguntas@hotmail.com

A CRIAÇÃO

 Este artigo é uma tentativa de esclarecer o conteúdo de uma cosmovisão bíblica e sua importância para nossas vidas, à medida que procuramos ser obedientes às Escrituras. As idéias que constituem esta cosmovisão não se originaram comigo. Elas vieram de uma longa tradição de reflexão Cristã sobre as Escrituras e nossa perspectiva total do mundo, uma tradição enraizada nas próprias Escritu-ras. Ela teve como alguns de seus representantes mais proeminentes os Pais da Igreja Irineu e Agos-tinho, e os Reformadores Tyndale e Calvino. Esta cosmovisão escriturística mencionada é às vezes chamada de "reformacional" após a Reforma Protestante, que descobriu novamente o ensino bíblico concernente à profundidade e escopo do pe-cado e da redenção. O desejo de viver pelas Escrituras somente, antes do que pelas Escrituras ao lado da tradição, é uma marca dos Reformadores. Nós seguimos seu caminho nesta ênfase bem como em querer uma reforma progressiva, em querer ser reformados pelas Escrituras continuamente (ver Atos 17:11; Romanos 12:2), antes do que viver por tradições não examinadas. A reflexão reformacional na cosmovisão tem ocupado distintas formas à medida que tem se movido no século vinte, algo que pode ser visto especialmente na obra de líderes holandeses como Abraham Kuyper, Herman Bavinck, Herman Dooyeweerd e D. H. T. Vollenhoven. Suas contribuições a uma compreensão mais profunda e articulada da cosmovisão bíblica vieram através da teologia, filosofia e outras disciplinas acadêmicas, e especialmente através da ação cultural e social que surgiram de um profundo desejo de serem obedientes às Escrituras em todas as áreas da vida e do serviço. O termo cosmovisão [worldview] veio da língua Inglesa como uma tradução da palavra alemã Wel-tanschauung [percepção (de mundo), ponto-de-vista, concepção (de mundo), cosmovisão]. Este termo tem a vantagem de ser claramente distinto de "filosofia" (ao menos no uso alemão) e de ser menos enfadonho do que a frase "visão do mundo e da vida", que foi preferida pelos neo-Calvinistas alemães (provavelmente seguindo um uso feito popular pelo filósofo Alemão [Wilhem] Dilthey). Um sinônimo aceitável é "perspectiva de vida" ou "visão confessional". Nós podemos também falar mais vagamente sobre o conjunto dos "princípios" ou "ideais" de uma pessoa. Um marxista chamá-lo-ia de uma "ideologia"; a classificação mais prevalecente nas ciências sociais hoje provavelmente é "sistema de valores". Estes termos são menos que aceitáveis porque os pró-prios termos possuem conotações de determinismo e relativismo que revelam uma cosmovisão ina-ceitável. Para nossas finalidades, cosmovisão será definida como "a estrutura abrangente das crenças básicas de alguém sobre coisas". Façamos um exame mais minucioso dos elementos desta definição. Primeiramente, "coisas" é um termo deliberadamente vago que se refere a qualquer coisa sobre a qual seja possível ter uma crença. Eu estou tomando-o no sentido mais geral que se possa imaginar, como abrangendo o mundo, a vida humana em geral, o significado do sofrimento, o valor da educa-ção, o social, a moralidade e a importância da família. Neste sentido pode-se dizer que até Deus está incluído entre as "coisas" sobre as quais temos crenças básicas. Segundo, uma cosmovisão é uma matéria das crenças de determinada pessoa. As crenças são dife-rentes dos sentimentos ou opiniões porque elas possuem uma "reivindicação cognitiva" - isto é, uma reivindicação a algum tipo de conhecimento. Eu posso dizer, por exemplo, que eu "creio" que a educação é o caminho para a felicidade humana. Isto significa que estou afirmando algo sobre o estado das coisas, o que o caso é. Estou querendo defender aquilo em que creio com argumentos. Os sentimentos não colocam reivindicação ao conhecimento, nem podem ser argumentados. Crenças não são opiniões, tampouco hipóteses. Para ser exato, nós às vezes usamos a palavra crer com aquele tipo de sentido enfraquecido ("Eu creio que Johnny chegará esta noite novamente tarde em casa"), mas eu estou usando aqui a palavra no sentido de "credo", uma crença comprometida, algo que estou disposto não somente a argumentar, mas também a defender ou promover com o gasto de dinheiro ou a paciência em meio ao sofrimento. Por exemplo, pode ser minha crença que a liberdade de expressão seja um direito inalienável na sociedade humana, ou que ninguém possa impor a sua religião a alguma outra pessoa. Sustentar uma crença pode exigir um sacrifício de mi-nha parte, ou a tolerância ao desprezo ou abuso se ela é uma crença dita não-popular ou não-ortodoxa, que os presídios devem castigar bem como reabilitar, ou que a livre iniciativa é o flagelo de nossa sociedade. Todas estas crenças são exemplos do que entra em uma cosmovisão. Tem a ver com as convicções de uma pessoa. Terceiro, é importante notar que as cosmovisões têm a ver com crenças básicas sobre coisas. Elas têm a ver com questões fundamentais com as quais somos confrontados; elas envolvem assuntos de princípio geral. Eu posso dizer que eu tenho uma crença segura de que os Yankees venceram o World Series de 1956, seguro a ponto de estar disposto a fazer uma grande aposta sobre isto, mas este tipo de crença não é o tipo que constitui uma cosmovisão. É diferente no caso de assuntos pro-fundos morais: A violência pode alguma vez ser justa? Há normas constantes para a vida humana? Existe um motivo para o sofrimento? Nós sobrevivemos à morte? Finalmente, as crenças básicas que uma determinada pessoa sustenta sobre coisas tendem a formar uma estrutura ou padrão; elas se unem de um certo modo. Eis a razão por que os humanistas freqüentemente falam de um "sistema de valores". Todos nós reconhecemos, em algum grau pelo me-nos, que devemos ser consistentes em nossas visões, se quisermos tomá-las com seriedade. Nós não adotamos uma posição arbitrária de crenças básicas que não possuam coerência ou não pareçam consistentes. Certas crenças básicas se chocam com outras. Por exemplo, a crença no matrimônio como uma ordenança de Deus não se comporta com a idéia de divórcio fácil. Uma convicção que filmes e teatros são essencialmente "divertimentos mundanos" não é muito consoante com o ideal de uma reforma cristã das artes. Uma crença otimista no progresso histórico é difícil de se harmoni-zar com a crença na depravação do homem. Isto não é dizer que cosmovisões nunca ou sejam internamente inconsistentes - muitas são (de fato, uma inconsistência pode ser uma das coisas mais interessantes sobre uma cosmovisão) - mas conti-nua sendo verdade que a característica mais significativa da cosmovisão é sua tendência voltada para o padrão e coerência; até suas inconsistências tendem a cair em padrões claramente reconhecí-veis. Além disso, a maioria das pessoas não admite uma inconsistência em sua própria cosmovisão, mesmo quando esta é muito óbvia a muitos outros. Tem sido assumido em nossa discussão até aqui que todos possuem uma cosmovisão de algum tipo. É este o caso, na realidade? Certamente é verdade que a maioria das pessoas não possui uma respos-ta se elas forem inquiridas de qual é sua cosmovisão, e os assuntos piorariam se eles fossem inquiri-dos sobre a estrutura de suas crenças básicas sobre as coisas. Contudo, suas crenças básicas emer-gem suficientemente depressa quando eles são enfrentados com questões práticas que se levantam, assuntos políticos atuais ou convicções que se confrontam com as suas. Como eles reagem ao servi-ço militar obrigatório, por exemplo? Qual é sua resposta ao evangelismo ou à contracultura, ao pa-cifismo ou comunismo? Que palavras de condolências podem oferecer ao lado da tumba? Quem eles responsabilizam pela inflação? Qual é a visão deles sobre aborto, pena de morte, disciplina na educação de crianças, homossexualidade, segregação racial, inseminação artificial, censura de fil-mes, sexo extra-conjugal e questões desse tipo? Todos estes assuntos despertam respostas que fornecem indicações da cosmovisão de uma pessoa pela sugestão de certos padrões ("conservador" ou "progressivo", sendo muito rudes e não confiáveis os padrões que a maioria das pessoas reconhece). Em geral, conseqüentemente, todos possuem uma cosmovisão; embora inarticulada, ele ou ela pode expressá-la. Ter uma cosmovisão é simplesmente parte de ser um ser humano adulto. Qual o papel da cosmovisão em nossas vidas? A resposta a isto, creio, é que nossa cosmovisão fun-ciona como um guia para nossa vida. Uma cosmovisão, até quando ela é meio inconsciente e desar-ticulada, funciona como um compasso ou um mapa de estrada. Ela nos orienta no mundo de forma geral, dando-nos um senso do que é alto e do que é baixo, do que é certo e do que é errado na con-fusão de eventos e fenômenos que nos confrontam. Nossa cosmovisão forma, em um grau significa-tivo, o modo pelo qual avaliamos os eventos, assuntos e estruturas de nossa civilização e de nossa época. Ela nos permite "colocar" ou "situar" os vários fenômenos que estão ao nosso alcance. De fato, outros fatores têm uma função neste processo de orientação (interesse próprio psicológico ou econômico, por exemplo), mas estes outros fatores não eliminam a função orientadora da cosmovi-são de alguém; eles freqüentemente influenciam através de nossa perspectiva de vida. Uma das características exclusivas dos seres humanos é que nós não podemos fazer nada sem um tipo de orientação ou condução que uma cosmovisão dá. Nós necessitamos ser guiados porque so-mos inescapavelmente criaturas com responsabilidade, que por natureza são incapazes de sustentar opiniões puramente arbitrárias ou fazer decisões inteiramente sem princípios. Nós necessitamos de algum credo para viver por ele, algum mapa pelo qual tracemos nosso curso. A necessidade de uma perspectiva condutora é básica para a vida humana, talvez mais básica do que alimento ou sexo. Não somente nossas visões e argumentos são decididamente afetados pela nossa cosmovisão, mas também todas as decisões específicas que somos levados a fazer. Quando o relacionamento matri-monial começa a ficar áspero, o divórcio é uma opção? Quando a cobrança de impostos é injusta, você trapaceia em seus formulários de impostos? Os crimes devem ser punidos?". Você demitirá um empregado tão logo isto se torne economicamente vantajoso? Você começará a se envolver em políticas? Você desencorajará seu filho ou filha de ser tornar um artista? As decisões que você faz nestes e muitos outros assuntos são guiadas pela sua cosmovisão. As disputas sobre elas envolvem freqüentemente um conflito de perspectivas de vida básicas. Novamente, temos de admitir que pode haver inconsistência aqui: não somente podemos sustentar crenças conflitantes, mas às vezes podemos falhar em agir em harmonia com as crenças que susten-tamos. Este é um fato de nossa experiência diária que todos devemos reconhecer. Mas, isto significa que nossa cosmovisão conseqüentemente não tem o papel guiador que estamos atribuindo a ela? Não necessariamente. Um navio pode ser desviado de seu curso por uma tempestade e ainda estar se dirigindo ao seu destino. É o padrão em geral que conta, o fato que o timoneiro faz tudo que for possível para permanecer no curso. Se sua ação está fora de sintonia com suas crenças, você tende a mudar suas ações ou suas crenças. Você não pode manter sua integridade (ou sua saúde mental) por muito tempo se não fizer nenhum esforço para resolver o conflito. Esta visão da relação de nossa cosmovisão com a nossa conduta é disputada por muitos pensadores. Os marxistas, por exemplo, sustentam que o que realmente guia nosso comportamento não são nos-sas crenças, mas os interesses de classes. Muitos psicólogos olham para as cosmovisões mais como guiadas do que como guiando, como racionalizações para comportamentos que são realmente con-trolados pelas dinâmicas de nossa vida emocional. Outros psicólogos sustentam que nossas ações são basicamente condicionadas pelos estímulos físicos vindos de nosso meio. Seria tolice desconsi-derar a evidência que esses pensadores apresentam para reforçar seus pontos de vista. Na realidade, é verdade que o comportamento humano é muito complexo e inclui tais assuntos como interesses de classes, o condicionamento e a influência de desejos reprimidos. A questão é o que constitui o fator decisivo e dominante que conta para o padrão da ação humana. O modo como respondemos esta questão depende de nossa visão da natureza essencial da humanidade: isto é em si mesmo um assunto de nossa cosmovisão. Do ponto de vista cristão, devemos dizer que nossa crença é um fator decisivo em nossas vidas, embora as crenças que professamos possam estar em desacordo com as crenças que estão atualmen-te operando em nossas vidas. É um mandamento do evangelho que vivamos nossas vidas em conformidade com as crenças ensi-nadas nas Escrituras. O fato de freqüentemente falharmos em viver este mandamento, não invalida o fato de que podemos e devemos viver de acordo com nossas crenças. Qual é, então, o relacionamento da cosmovisão com as Escrituras? A resposta cristã a esta questão é: nossa cosmovisão deve ser formada e testada pelas Escrituras. Ela pode legitimamente guiar nos-sas vidas somente se ela for escriturística. Isto significa que, no assunto da cosmovisão, há um a-bismo significativo entre aqueles que aceitam estas Escrituras como sendo a Palavra de Deus e a-queles que não aceitam. Isto significa que os cristãos devem constantemente verificar suas crenças da cosmovisão à luz das Escrituras, porque se não o fizerem haverá uma poderosa inclinação a re-ceber muitas de nossas crenças, até as básicas, de uma cultura que tem sido secularizada em ritmo acelerado por gerações. Uma boa parte da finalidade deste livro é oferecer ajuda no processo de reformar nossa cosmovisão, para conformá-la mais estreitamente ao ensino das Escrituras. Como cristãos, confessamos que as Escrituras têm a autoridade de Deus, que é superior a tudo mais - acima da opinião pública, da educação, da criação de crianças, da mídia, e em resumo, acima de todas as poderosas interferências em nossa cultura pela qual a cosmovisão está constantemente sen-do formada. Contudo, uma vez que estas interferências em nossa cultura deliberadamente ignoram, e de fato usualmente rejeitam por completo a suprema autoridade das Escrituras, há considerável pressão sobre os cristãos para restringirem seu reconhecimento da autoridade das Escrituras à área da Igreja, da teologia e da moralidade pessoal - uma área que tem se tornado basicamente irrelevan-te no rumo tomado pela cultura e pela sociedade como um todo. Esta pressão, contudo, é em si mesma o fruto de uma cosmovisão secular, e deve ser resistida pelos cristãos com todos os recursos de que dispõem. Os recursos fundamentais são as próprias Escrituras. apologetica.perguntas@hotmail.com

O QUE É COSMOVISÃO?

Este livro é uma tentativa de esclarecer o conteúdo de uma cosmovisão bíblica e sua importância para nossas vidas, à medida que procuramos ser obedientes às Escrituras. As idéias que constituem esta cosmovisão não se originaram comigo. Elas vieram de uma longa tradição de reflexão Cristã sobre as Escrituras e nossa perspectiva total do mundo, uma tradição enraizada nas próprias Escritu-ras. Ela teve como alguns de seus representantes mais proeminentes os Pais da Igreja Irineu e Agos-tinho, e os Reformadores Tyndale e Calvino. Esta cosmovisão escriturística mencionada é às vezes chamada de "reformacional" após a Reforma Protestante, que descobriu novamente o ensino bíblico concernente à profundidade e escopo do pe-cado e da redenção. O desejo de viver pelas Escrituras somente, antes do que pelas Escrituras ao lado da tradição, é uma marca dos Reformadores. Nós seguimos seu caminho nesta ênfase bem como em querer uma reforma progressiva, em querer ser reformados pelas Escrituras continuamente (ver Atos 17:11; Romanos 12:2), antes do que viver por tradições não examinadas. A reflexão reformacional na cosmovisão tem ocupado distintas formas à medida que tem se movido no século vinte, algo que pode ser visto especialmente na obra de líderes holandeses como Abraham Kuyper, Herman Bavinck, Herman Dooyeweerd e D. H. T. Vollenhoven. Suas contribuições a uma compreensão mais profunda e articulada da cosmovisão bíblica vieram através da teologia, filosofia e outras disciplinas acadêmicas, e especialmente através da ação cultural e social que surgiram de um profundo desejo de serem obedientes às Escrituras em todas as áreas da vida e do serviço. O termo cosmovisão [worldview] veio da língua Inglesa como uma tradução da palavra alemã Wel-tanschauung [percepção (de mundo), ponto-de-vista, concepção (de mundo), cosmovisão]. Este termo tem a vantagem de ser claramente distinto de "filosofia" (ao menos no uso alemão) e de ser menos enfadonho do que a frase "visão do mundo e da vida", que foi preferida pelos neo-Calvinistas alemães (provavelmente seguindo um uso feito popular pelo filósofo Alemão [Wilhem] Dilthey). Um sinônimo aceitável é "perspectiva de vida" ou "visão confessional". Nós podemos também falar mais vagamente sobre o conjunto dos "princípios" ou "ideais" de uma pessoa. Um marxista chamá-lo-ia de uma "ideologia"; a classificação mais prevalecente nas ciências sociais hoje provavelmente é "sistema de valores". Estes termos são menos que aceitáveis porque os pró-prios termos possuem conotações de determinismo e relativismo que revelam uma cosmovisão ina-ceitável. Para nossas finalidades, cosmovisão será definida como "a estrutura abrangente das crenças básicas de alguém sobre coisas". Façamos um exame mais minucioso dos elementos desta definição. Primeiramente, "coisas" é um termo deliberadamente vago que se refere a qualquer coisa sobre a qual seja possível ter uma crença. Eu estou tomando-o no sentido mais geral que se possa imaginar, como abrangendo o mundo, a vida humana em geral, o significado do sofrimento, o valor da educa-ção, o social, a moralidade e a importância da família. Neste sentido pode-se dizer que até Deus está incluído entre as "coisas" sobre as quais temos crenças básicas. Segundo, uma cosmovisão é uma matéria das crenças de determinada pessoa. As crenças são dife-rentes dos sentimentos ou opiniões porque elas possuem uma "reivindicação cognitiva" - isto é, uma reivindicação a algum tipo de conhecimento. Eu posso dizer, por exemplo, que eu "creio" que a educação é o caminho para a felicidade humana. Isto significa que estou afirmando algo sobre o estado das coisas, o que o caso é. Estou querendo defender aquilo em que creio com argumentos. Os sentimentos não colocam reivindicação ao conhecimento, nem podem ser argumentados. Crenças não são opiniões, tampouco hipóteses. Para ser exato, nós às vezes usamos a palavra crer com aquele tipo de sentido enfraquecido ("Eu creio que Johnny chegará esta noite novamente tarde em casa"), mas eu estou usando aqui a palavra no sentido de "credo", uma crença comprometida, algo que estou disposto não somente a argumentar, mas também a defender ou promover com o gasto de dinheiro ou a paciência em meio ao sofrimento. Por exemplo, pode ser minha crença que a liberdade de expressão seja um direito inalienável na sociedade humana, ou que ninguém possa impor a sua religião a alguma outra pessoa. Sustentar uma crença pode exigir um sacrifício de mi-nha parte, ou a tolerância ao desprezo ou abuso se ela é uma crença dita não-popular ou não-ortodoxa, que os presídios devem castigar bem como reabilitar, ou que a livre iniciativa é o flagelo de nossa sociedade. Todas estas crenças são exemplos do que entra em uma cosmovisão. Tem a ver com as convicções de uma pessoa. Terceiro, é importante notar que as cosmovisões têm a ver com crenças básicas sobre coisas. Elas têm a ver com questões fundamentais com as quais somos confrontados; elas envolvem assuntos de princípio geral. Eu posso dizer que eu tenho uma crença segura de que os Yankees venceram o World Series de 1956, seguro a ponto de estar disposto a fazer uma grande aposta sobre isto, mas este tipo de crença não é o tipo que constitui uma cosmovisão. É diferente no caso de assuntos pro-fundos morais: A violência pode alguma vez ser justa? Há normas constantes para a vida humana? Existe um motivo para o sofrimento? Nós sobrevivemos à morte? Finalmente, as crenças básicas que uma determinada pessoa sustenta sobre coisas tendem a formar uma estrutura ou padrão; elas se unem de um certo modo. Eis a razão por que os humanistas freqüentemente falam de um "sistema de valores". Todos nós reconhecemos, em algum grau pelo me-nos, que devemos ser consistentes em nossas visões, se quisermos tomá-las com seriedade. Nós não adotamos uma posição arbitrária de crenças básicas que não possuam coerência ou não pareçam consistentes. Certas crenças básicas se chocam com outras. Por exemplo, a crença no matrimônio como uma ordenança de Deus não se comporta com a idéia de divórcio fácil. Uma convicção que filmes e teatros são essencialmente "divertimentos mundanos" não é muito consoante com o ideal de uma reforma cristã das artes. Uma crença otimista no progresso histórico é difícil de se harmoni-zar com a crença na depravação do homem. Isto não é dizer que cosmovisões nunca ou sejam internamente inconsistentes - muitas são (de fato, uma inconsistência pode ser uma das coisas mais interessantes sobre uma cosmovisão) - mas conti-nua sendo verdade que a característica mais significativa da cosmovisão é sua tendência voltada para o padrão e coerência; até suas inconsistências tendem a cair em padrões claramente reconhecí-veis. Além disso, a maioria das pessoas não admite uma inconsistência em sua própria cosmovisão, mesmo quando esta é muito óbvia a muitos outros. Tem sido assumido em nossa discussão até aqui que todos possuem uma cosmovisão de algum tipo. É este o caso, na realidade? Certamente é verdade que a maioria das pessoas não possui uma respos-ta se elas forem inquiridas de qual é sua cosmovisão, e os assuntos piorariam se eles fossem inquiri-dos sobre a estrutura de suas crenças básicas sobre as coisas. Contudo, suas crenças básicas emer-gem suficientemente depressa quando eles são enfrentados com questões práticas que se levantam, assuntos políticos atuais ou convicções que se confrontam com as suas. Como eles reagem ao servi-ço militar obrigatório, por exemplo? Qual é sua resposta ao evangelismo ou à contracultura, ao pa-cifismo ou comunismo? Que palavras de condolências podem oferecer ao lado da tumba? Quem eles responsabilizam pela inflação? Qual é a visão deles sobre aborto, pena de morte, disciplina na educação de crianças, homossexualidade, segregação racial, inseminação artificial, censura de fil-mes, sexo extra-conjugal e questões desse tipo? Todos estes assuntos despertam respostas que fornecem indicações da cosmovisão de uma pessoa pela sugestão de certos padrões ("conservador" ou "progressivo", sendo muito rudes e não confiáveis os padrões que a maioria das pessoas reconhece). Em geral, conseqüentemente, todos possuem uma cosmovisão; embora inarticulada, ele ou ela pode expressá-la. Ter uma cosmovisão é simplesmente parte de ser um ser humano adulto. Qual o papel da cosmovisão em nossas vidas? A resposta a isto, creio, é que nossa cosmovisão fun-ciona como um guia para nossa vida. Uma cosmovisão, até quando ela é meio inconsciente e desar-ticulada, funciona como um compasso ou um mapa de estrada. Ela nos orienta no mundo de forma geral, dando-nos um senso do que é alto e do que é baixo, do que é certo e do que é errado na con-fusão de eventos e fenômenos que nos confrontam. Nossa cosmovisão forma, em um grau significa-tivo, o modo pelo qual avaliamos os eventos, assuntos e estruturas de nossa civilização e de nossa época. Ela nos permite "colocar" ou "situar" os vários fenômenos que estão ao nosso alcance. De fato, outros fatores têm uma função neste processo de orientação (interesse próprio psicológico ou econômico, por exemplo), mas estes outros fatores não eliminam a função orientadora da cosmovi-são de alguém; eles freqüentemente influenciam através de nossa perspectiva de vida. Uma das características exclusivas dos seres humanos é que nós não podemos fazer nada sem um tipo de orientação ou condução que uma cosmovisão dá. Nós necessitamos ser guiados porque so-mos inescapavelmente criaturas com responsabilidade, que por natureza são incapazes de sustentar opiniões puramente arbitrárias ou fazer decisões inteiramente sem princípios. Nós necessitamos de algum credo para viver por ele, algum mapa pelo qual tracemos nosso curso. A necessidade de uma perspectiva condutora é básica para a vida humana, talvez mais básica do que alimento ou sexo. Não somente nossas visões e argumentos são decididamente afetados pela nossa cosmovisão, mas também todas as decisões específicas que somos levados a fazer. Quando o relacionamento matri-monial começa a ficar áspero, o divórcio é uma opção? Quando a cobrança de impostos é injusta, você trapaceia em seus formulários de impostos? Os crimes devem ser punidos?". Você demitirá um empregado tão logo isto se torne economicamente vantajoso? Você começará a se envolver em políticas? Você desencorajará seu filho ou filha de ser tornar um artista? As decisões que você faz nestes e muitos outros assuntos são guiadas pela sua cosmovisão. As disputas sobre elas envolvem freqüentemente um conflito de perspectivas de vida básicas. Novamente, temos de admitir que pode haver inconsistência aqui: não somente podemos sustentar crenças conflitantes, mas às vezes podemos falhar em agir em harmonia com as crenças que susten-tamos. Este é um fato de nossa experiência diária que todos devemos reconhecer. Mas, isto significa que nossa cosmovisão conseqüentemente não tem o papel guiador que estamos atribuindo a ela? Não necessariamente. Um navio pode ser desviado de seu curso por uma tempestade e ainda estar se dirigindo ao seu destino. É o padrão em geral que conta, o fato que o timoneiro faz tudo que for possível para permanecer no curso. Se sua ação está fora de sintonia com suas crenças, você tende a mudar suas ações ou suas crenças. Você não pode manter sua integridade (ou sua saúde mental) por muito tempo se não fizer nenhum esforço para resolver o conflito. Esta visão da relação de nossa cosmovisão com a nossa conduta é disputada por muitos pensadores. Os marxistas, por exemplo, sustentam que o que realmente guia nosso comportamento não são nos-sas crenças, mas os interesses de classes. Muitos psicólogos olham para as cosmovisões mais como guiadas do que como guiando, como racionalizações para comportamentos que são realmente con-trolados pelas dinâmicas de nossa vida emocional. Outros psicólogos sustentam que nossas ações são basicamente condicionadas pelos estímulos físicos vindos de nosso meio. Seria tolice desconsi-derar a evidência que esses pensadores apresentam para reforçar seus pontos de vista. Na realidade, é verdade que o comportamento humano é muito complexo e inclui tais assuntos como interesses de classes, o condicionamento e a influência de desejos reprimidos. A questão é o que constitui o fator decisivo e dominante que conta para o padrão da ação humana. O modo como respondemos esta questão depende de nossa visão da natureza essencial da humanidade: isto é em si mesmo um assunto de nossa cosmovisão. Do ponto de vista cristão, devemos dizer que nossa crença é um fator decisivo em nossas vidas, embora as crenças que professamos possam estar em desacordo com as crenças que estão atualmen-te operando em nossas vidas. É um mandamento do evangelho que vivamos nossas vidas em conformidade com as crenças ensi-nadas nas Escrituras. O fato de freqüentemente falharmos em viver este mandamento, não invalida o fato de que podemos e devemos viver de acordo com nossas crenças. Qual é, então, o relacionamento da cosmovisão com as Escrituras? A resposta cristã a esta questão é: nossa cosmovisão deve ser formada e testada pelas Escrituras. Ela pode legitimamente guiar nos-sas vidas somente se ela for escriturística. Isto significa que, no assunto da cosmovisão, há um a-bismo significativo entre aqueles que aceitam estas Escrituras como sendo a Palavra de Deus e a-queles que não aceitam. Isto significa que os cristãos devem constantemente verificar suas crenças da cosmovisão à luz das Escrituras, porque se não o fizerem haverá uma poderosa inclinação a re-ceber muitas de nossas crenças, até as básicas, de uma cultura que tem sido secularizada em ritmo acelerado por gerações. Uma boa parte da finalidade deste livro é oferecer ajuda no processo de reformar nossa cosmovisão, para conformá-la mais estreitamente ao ensino das Escrituras. Como cristãos, confessamos que as Escrituras têm a autoridade de Deus, que é superior a tudo mais - acima da opinião pública, da educação, da criação de crianças, da mídia, e em resumo, acima de todas as poderosas interferências em nossa cultura pela qual a cosmovisão está constantemente sen-do formada. Contudo, uma vez que estas interferências em nossa cultura deliberadamente ignoram, e de fato usualmente rejeitam por completo a suprema autoridade das Escrituras, há considerável pressão sobre os cristãos para restringirem seu reconhecimento da autoridade das Escrituras à área da Igreja, da teologia e da moralidade pessoal - uma área que tem se tornado basicamente irrelevan-te no rumo tomado pela cultura e pela sociedade como um todo. Esta pressão, contudo, é em si mesma o fruto de uma cosmovisão secular, e deve ser resistida pelos cristãos com todos os recursos de que dispõem. Os recursos fundamentais são as próprias Escrituras. As Escrituras representam muitas coisas para o cristão, mas a principal é a instrução. Não há passa-gem nas Escrituras que não possa nos ensinar algo sobre Deus e Seu relacionamento conosco. Nós devemos nos aproximar das Escrituras como estudantes, particularmente quando começamos a pen-sar criticamente sobre nossa própria cosmovisão. "Porquanto, tudo que dantes foi escrito, para nos-so ensino foi escrito", diz Paulo sobre o Velho Testamento (Romanos 15:4), e o mesmo se aplica ao Novo Testamento. Eis por que o conceito de "sã doutrina" é tão central no testemunho apostólico - não doutrina no sentido de teologia acadêmica, mas como instrução prática nas realidades de vida e morte de nosso andar em compromisso com Deus. É por meio deste tipo de ensino que a constância e encorajamento provenientes das Escrituras nos capacitam, como Paulo apontou na mesma passa-gem, não para nos desesperarmos, mas para estabelecermos nossa esperança em Cristo. Isto está envolvido também no que Paulo chama a "renovação de nossas mentes" (Romanos 12:2). Nós ne-cessitamos deste renovo se formos discernir qual é a vontade de Deus em toda a sua extensão para nossas vidas - "sua boa, agradável e perfeita vontade". Testar nossa cosmovisão à luz das Escritu-ras e revisá-la de acordo com ela é parte do renovo da mente. Esta ênfase no ensino escriturístico é claramente um aspecto fundamental da religião cristã. Todas as variedades de cristãos, apesar de todas suas diferenças, concordam sobre este ponto de uma for-ma ou de outra. Contudo é necessário enfatizá-la novamente com referência à questão de nossa cosmovisão, porque quase todos os ramos da Igreja Cristã também concordam que o ensino das Escrituras é basicamente um assunto de teologia e moralidade pessoal, um setor privado rotulado de "sagrado" e "religioso", separado dos amplos assuntos do ser humano, rotulados de "seculares". As Escrituras, de acordo com esta visão, precisam certamente formar nossa teologia (incluindo nossas "éticas teológicas"), mas são, na melhor das hipóteses, somente indiretamente e tangencialmente relacionadas a assuntos seculares tais como política, arte e conhecimento: a Bíblia nos ensina uma visão de Igreja e uma visão de Deus, não uma cosmovisão. Este é um erro perigoso. Sem dúvida, nós devemos ser ensinados pelas Escrituras em assuntos tais como batismo, oração, eleição e igreja, mas as Escrituras falam centralmente a tudo em nossa vida e mundo, incluindo tecnologia, economia e ciência. O escopo do ensino bíblico inclui assuntos ordi-nários "seculares" como labor, grupos sociais e educação. A menos que tais assuntos estejam apro-ximados em termos de uma cosmovisão baseada honestamente em categorias escriturísticas centrais como criação, pecado e redenção, nossa avaliação destas dimensões supostamente não-religiosas de nossas vidas será provavelmente dominada por uma das competitivas cosmovisões do Ocidente secularizado. Conseqüentemente, é essencial relacionar os conceitos básicos de "teologia bíblica" à nossa cosmovisão - ou melhor, entender estes conceitos básicos como constituindo uma cosmovi-são. Em certo sentido, o apelo que está sendo feito aqui para uma cosmovisão bíblica é simples-mente um apelo para o crente levar a sério a Bíblia e seu ensino para a totalidade de nossa civiliza-ção agora mesmo, e não para relegá-la a alguma área opcional chamada "religião". Tudo isto levanta a questão do relacionamento do que eu tenho chamado de "cosmovisão" com a teologia e a filosofia. Este é um assunto que causa certa confusão, uma vez que na conversação co-mum quaisquer perspectivas abrangentes sobre as coisas que apela à autoridade da Bíblia são cha-madas de "teologia", e qualquer perspectiva que apela à autoridade da razão é chamada de "filosofi-a". O problema com este modo de falar é que ele falha em fazer uma distinção entre a perspectiva de vida que todo ser humano tem pelo fato de ser humano e as disciplinas acadêmicas especializa-das que são ensinadas pelos professores de teologia e filosofia. Além disso, ela faz uma suposição equivocada que a teologia não pode ser pagã ou humanística e que a filosofia não pode ser bíblica. A diferença entre cristão e não-cristão não pode ser tão facilmente dividida entre duas disciplinas acadêmicas. Teologia e filosofia são campos especializados de investigação que nem todos podem adentrar. Elas requerem habilidades especiais, um certo tipo de inteligência e uma quantia considerável de melhor: "conhecimento" ou "instrução". Eles são campos para especialistas treinados. Isto não é dizer que elas estão fechadas ao leigo inteligente; simplesmente significa que os leigos têm uma desvantagem melhor: "definida" em si, pelo simples fato de estarem nas ciências médicas, econômicas e em campos não-acadêmicos específicos como altas finanças e diplomacia internacional. Em todos estes campos há homens e mulheres profissionais, que são especializados na área. Teologia e filosofia não são exceção. Mas a cosmovisão é um assunto totalmente diferente. Você não necessita de títulos ou habilidades especiais para ter uma perspectiva na vida. Sabedoria bíblica ou sã doutrina não aumentam com o avanço do treinamento teológico. Se aumentasse, os profetas e apóstolos, para não mencionar o próprio Jesus, teriam sido totalmente deficientes comparados com os brilhantes e jovens teólogos de hoje que acabam de sair de uma faculdade. Brilhantismo acadêmico é algo totalmente diferente de sabedoria e de senso comum - e uma cosmovisão é uma questão de sabedoria e senso comum, seja bíblico ou não. Sem tentar definir precisamente a natureza de "ciência" e "teoria" (que neste contexto podemos considerar sinônimos), podemos dizer que filosofia e teologia, como disciplinas acadêmicas, são cientificas e teóricas, enquanto que uma cosmovisão não é. Uma cosmovisão é uma questão da ex-periência diária da humanidade compartilhada, um componente inescapável de todo saber humano, ou melhor, (desde que o conhecimento cientifico é sempre dependente do conhecimento intuitivo de nossa experiência diária) pré-científico, por natureza. Ela pertence a uma ordem de cognição mais básica do que a da ciência ou teoria. Da mesma forma que a estética pressupõe algum senso inato de beleza, e a teoria legal pressupõe uma noção fundamental de justiça, assim a teologia e filosofia pressupõem uma perspectiva pré-teórica sobre o mundo. Elas dão uma elaboração cientifica de uma cosmovisão. No geral, então, podemos dizer que cosmovisão, filosofia e teologia são semelhantes no sentido de serem abrangentes em escopo, mas que elas são diferentes no que uma cosmovisão é pré-científica, ao passo que a filosofia e teologia são científicas. A distinção entre filosofia e teologia pode talvez se tornar mais clara se introduzirmos dois conceitos chaves: "estrutura" e "rumo". A filosofia pode ser descrita como aquela disciplina científica abrangente (totalmente orientada) que se foca na estrutura das coisas - isto é, na unidade e diversidade daquilo que é dado nas coisas criadas. Teo-logia (isto é, teologia sistemática cristã), por outro lado, pode ser considerada aquela disciplina cientifica abrangente (totalmente orientada) que se foca no rumo das coisas - isto é, no mal que contagia o mundo e a cura que pode salvá-lo. A filosofia cristã olha para a criação à luz das categorias básicas da Bíblia; a teologia cristã olha para a Bíblia à luz das categorias básicas da criação. Uma cosmovisão, ao contrário, é igualmente relacionada tanto com as questões estruturais como direcionais. Ela não tem contudo a diferenciação de foco característica das disciplinas científicas abrangentes (ou amplas). Há muito que se pode dizer sobre estas distinções, especialmente sobre a distinção entre estrutura e direção, mas que terá de esperar até um ponto posterior em nossa discussão. No momento estamos somente tocando nele resumidamente para esclarecer o relacionamento entre os três modos abran-gentes de entender o mundo. Agora que temos uma idéia geral do que uma cosmovisão é, resta-nos falar o que é diferente na cosmovisão reformacional. Que características peculiares a distinguem de outras cosmovisões, tanto da pagã ou humanista como daquelas cristãs. Devemos começar aceitando o fato que há diferentes cosmovisões cristãs, até dentro da corrente principal da ortodoxia cristã histórica. Há um sentido, naturalmente, em que todas as igrejas cristãs ortodoxas (que iremos entender neste contexto como sendo aquelas igrejas cristãs que aceitam os assim chamados credos ecumênicos da igreja primitiva) compartilham uma boa quantidade do ensi-no bíblico básico. Todas elas aceitam a Bíblia como a Palavra de Deus, crêem em um Criador trans-cendental que fez todas as coisas, que a desgraça humana é devida ao pecado e que Jesus Cristo veio para expiar este pecado e redimir a humanidade de sua maldição, afirmam que Deus é pessoal e triúno, que Cristo é tanto divino como humano, e assim por diante. Nós não devemos minimizar a extensão na qual a Igreja Ortodoxa Oriental, a Católica Romana e vários tipos de tradições protes-tantes compartilham a mesma herança e confissão bíblica. Não obstante, estamos bem cientes das profundas divisões dentro da igreja cristã. Estas divisões refletem diferenças de cosmovisão bem como diferenças de teologia no sentido estrito da palavra. Gostaria de brevemente identificar as diferenças básicas entre a cosmovisão reformacional e outras cosmovisões cristãs. Um modo de ver esta diferença é usar a definição básica de fé cristã dada por Herman Bavinck: "Deus o Pai reconciliou o mundo criado por Ele porém caído, através da morte de Seu Filho, e re-nova-o em um Reino de Deus pelo Seu Espírito". A cosmovisão reformacional toma todos os ter-mos chaves nesta confissão trinitariana ecumênica num sentido universal e todo-abrangente. Os termos "reconciliado", "criado", "caído", "mundo", "renova" e "reino de Deus" são tidos por cós-micos no escopo. Em principio, nada à parte do próprio Deus fica fora da extensão destas realidades fundamentais da religião bíblica. Todas as outras cosmovisões cristãs, ao contrário, restringem o escopo de cada um destes termos de um ou outro modo. Compreende-se que cada um se aplica somente a uma área delimitada do uni-verso de nossa experiência, usualmente chamado de a esfera "religiosa" ou "sagrada". Tudo que esteja fora desta área delimitada é chamado de a esfera "mundana", ou "secular", ou "natural" ou "profana". Todas estas teorias das "duas esferas", como são chamadas, são talvez melhor "varian-tes" de uma cosmovisão basicamente dualística, em oposição à perspectiva integral da cosmovisão reformacional, que não aceita uma distinção entre as esferas sagrada e secular no cosmo. Esta é uma maneira de explicar a distinção da cosmovisão reformacional. Outra maneira é dizer que suas características distintivas são organizadas ao redor da visão central de que "a graça restaura a natureza" - isto é, a redenção em Jesus Cristo significa a restauração de uma criação originalmente boa. (Naturalmente quero dizer "realidade criada" nestes contextos). Em outras palavras, redenção é re-criação. Se olharmos para isto mais atentamente, podemos ver que esta afirmação básica real-mente envolve três dimensões fundamentais: a criação originalmente boa, a perversão da criação através do pecado e a restauração da criação em Cristo. Isto mostra quão central a doutrina da cria-ção se torna em tal visão, visto que o propósito completo da salvação é, então, o de salvar uma cria-ção corrompida pelo pecado. Nas cosmovisões não-reformacionais, contudo, a graça inclui algo além da natureza, com o resultado que a salvação é algo basicamente "não-criacional", super-criacional, ou até mesmo anti-criacional. Em tais perspectivas, seja o que for que Cristo traga além da criação pertence à esfera sagrada, enquanto que a criação original constitui a esfera secular. Nos próximos três capítulos, observaremos as três categorias bíblicas básicas da criação, queda e redenção. Até aqui falamos bastante abstratamente sobre a cosmovisão reformacional para colocá-la no amplo contexto das cosmovisões cristãs como um todo. Agora é tempo de nos tornar mais espe-cíficos, relacionando a cosmovisão reformacional tanto nos temas centrais das Escrituras como nas realidades básicas de nossa experiência cultural e social.

A INFALIBILIDADE PAPAL

 Veneráveis padres e irmãos: Não sem temor, porém com uma consciência livre e tranqüila, ante Deus que nos julga, tomo a palavra nesta augusta assembléia. Prestei toda a minha atenção aos discursos que se pronunciaram nesta sala, e anseio por um raio de luz que, descendo de cima, ilumine a minha inteligência e me permita votar os cânones deste Concílio Ecumênico, com perfeito conhecimento de causa. Compenetrado da minha responsabilidade, pela qual Deus me pedirá contas, estudei com a mais escrupulosa atenção os escritos do Antigo e do Novo Testamento, e interroguei esses veneráveis monumentos da Verdade: se o pontífice que preside aqui é verdadeiramente o sucessor de São Pedro, vigário do Cristo e infalível doutor da Igreja. Transportei-me aos tempos em que ainda não existiam o ultramontanismo [1] nem o galicanismo [2] , em que a Igreja tinha por doutores: São Paulo, São Pedro, São Tiago e São João, aos quais não se pode negar a autoridade divina, sem pôr em dúvida o que a santa Bíblia que o Concílio de Trento proclamou como a regra da Fé e da Moral. Abri essas sagradas páginas e sou obrigado a dizer-vos: nada encontrei que sancione, próxima ou remotamente, a opinião dos ultramontanos! E maior é a minha surpresa quando, naqueles tempos apostólicos, nada há que fale de papa para sucessor de S. Pedro e vigário de Jesus Cristo! Vós, Monsenhor Manning, direis que blasfemo; vós Monsenhor Pio, direis que estou demente! Não, Monsenhores; não blasfemo nem perdi o juízo! Tendo lido todo o Novo Testamento, declaro, ante Deus e com a mão sobre o crucifixo, que nenhum vestígio encontrei do papado. Não me recuseis a vossa atenção, meus veneráveis irmãos! Com os vossos sussurros e interrupções justificais os que dizem, como o padre Jacinto, que este Concílio não é livre; se assim for, tende em vista que esta augusta assembléia, que prende a atenção de todo o mundo, cairá no mais terrível descrédito. Agradeço a Sua Ex., o Monsenhor Dupanloup, o sinal de aprovação que me faz com a cabeça; isso me alenta e anima prosseguir. Lendo, pois os santos livros, não encontrei neles um só capítulo, um só versículo que dê a São Pedro a chefia sobre os Apóstolos. Não só o Cristo nada disse sobre esse ponto, como, ao contrário, prometeu tronos a todos os Apóstolos (Mateus, cap. XIX, v. 28), sem dizer que o de Pedro seria o mais elevado que os dos outros! Que diremos do seu silêncio? A lógica nos ensina a concluir que o Cristo nunca pensou em elevar Pedro à chefia do Colégio Apostólico. Quando Cristo enviou os seus discípulos a conquistar o mundo, a todos — igualmente — fez a promessa do Espírito Santo. Dizem as Santas Escrituras que até proibiu a Pedro e a seus colegas de reinarem ou exercerem senhorio (Lucas, XXII, 25 e 26). Se Pedro fosse eleito papa Jesus não diria isso, porque, segundo a nossa tradição, o papado tem uma espada em cada mão, simbolizando os poderes espiritual e temporal. Ainda mais: se Pedro fosse papa ou chefe dos Apóstolos, permitiria que esses seus subordinados o enviassem, com João, à Samaria, para anunciar o Evangelho do Filho de Deus? (Atos, c. VIII, v. 14). Que direis vós, veneráveis irmãos, se nos permitíssemos, agora mesmo, mandar Sua Santidade Pio IX, que aqui preside, e Sua Eminência, Monsenhor Plantier, ao Patriarca de Constantinopla, para convencê-lo de que deve acabar com o cisma do oriente? O símile é perfeito, haveis de concordar. Mas temos coisa ainda melhor: Reuniu-se em Jerusalém um concílio ecumênico para decidir questões que dividiam os fiéis. Quem devia convocá-lo? Sem dúvida, Pedro, se fosse papa. Quem devia presidir a ele? Por certo, Pedro. Quem devia formular e promulgar os cânones? Ainda Pedro, não é verdade? Pois bem: nada disso sucedeu! Pedro assistiu ao concílio com os demais Apóstolos, sob a direção de São Tiago! (Atos, cap. XV). Assim, parece-me que o filho de Jonas não era o primeiro, como sustentais. Encarando agora por outro lado, temos: enquanto ensinamos que a Igreja está edificada sobre Pedro, S. Paulo (cuja autoridade devemos todos acatar) diz-nos que ela está edificada sobre o fundamento da fé dos Apóstolos e Profetas, sendo Jesus Cristo a principal pedra do ângulo. (Epistola aos Efésios, cap. II, v. 20) Esse mesmo Paulo, ao enumerar os ofícios da Igreja, menciona apóstolos, profetas, evangelistas e pastores; e será crível que o grande Apóstolo dos gentios se esquecesse do papado, se o papado existisse? Esse olvido me parece tão impossível como um historiador deste Concílio que não fizesse menção de Sua Santidade Pio IX. (Apartes: Silêncio, herege! Silêncio!)·... Calmai-vos, veneráveis irmãos, porque ainda não conclui, impedindo-me de prosseguir, provareis ao mundo que sabeis ser injustos, tapando a boca do mais pequeno membro desta assembléia. Continuarei: O Apóstolo Paulo não faz menção, em nenhuma das suas Epistolas, às diferentes Igrejas, da primazia de Pedro; se essa existisse e se ele fosse infalível como quereis, poderia Paulo deixar de mencioná-la, em longa Epístola sobre tão importante ponto? Concordai comigo. A Igreja nunca foi mais bela, mais pura e mais santa que naqueles tempos em que não tinha papa. (Apartes: Não é exato; não é exato!). Porque negais, Monsenhor de Laval? Se algum de vós outros, meus veneráveis irmãos, se atreve a pensar que a Igreja, que hoje tem um papa (que vai ficar infalível), é mais firme na fé e mais pura na moralidade que a Igreja Apostólica, diga-o abertamente ante o Universo, visto como este recinto é um centro do qual as nossas palavras voam de pólo a pólo! Calai-vos? Então continuarei: Também nos escritos de S. Paulo, de S. João, ou de S. Tiago, não descubro traço algum do poder papal! S. Lucas, o historiador dos trabalhos Apostólicos, guarda silêncio sobre tal assunto! Isso deve preocupar-vos muito. Não me julgueis um cismático! Entrei pela mesma porta que vós outros; o meu título de Bispo deu-me direito a comparecer aqui, e a minha consciência, inspirada no verdadeiro Cristianismo, me obriga a dizer-vos o que julga ser verdade. Pensei que, se Pedro fosse vigário de Jesus Cristo, ele não o sabia, pois que nunca procedeu como papa: nem no dia de Pentecostes, quando pregou o seu primeiro sermão, nem no Concílio de Jerusalém, presidido por S. Tiago, nem na Antioquia, e nem nas Epístolas que dirigia às Igrejas. Será possível que ele fosse papa sem o saber? Parece-me escutar de todos os lados: Pois S. Pedro não esteve em Roma? Não foi crucificado de cabeça para baixo? Não existem os lugares onde ensinou e os altares onde disse missa nessa cidade? E eu responderei: Só a tradição, veneráveis irmãos, é que nos diz ter S. Pedro estado em Roma; e como a tradição é tão somente a tradição da sua estada em Roma, é com ela que me provareis o seu episcopado e a sua supremacia? Scalígero, um dos mais eruditos historiadores, não vacila em dizer que o episcopado de S. Pedro e a sua residência em Roma se devem classificar no número das lendas mais ridículas! (Repetidos gritos e apartes: Tapai-lhe a boca, fazei-o descer desta cadeira!). Meus veneráveis irmãos, não faço questão de calar-me como quereis, mas não será melhor examinar todas as coisas como manda o Apóstolo, e crer só no que for bom? Lembrai-vos de que temos um ditador ante o qual todos nós, mesmo Sua Santidade Pio IX, devemos curvar a cabeça: Esse ditador, vós bem o sabeis, é a História! Permiti que repita: Folheando os sagrados escritos não encontrei o mais leve vestígio do papado nos tempos apostólicos! E percorrendo os anais da Igreja, nos quatro primeiros séculos, o mesmo me sucedeu! Confessar-vos-ei que o que encontrei foi o seguinte: Que o grande Santo Agostinho, bispo de Hipona , honra e glória do Cristianismo e secretário no Concílio de Melive, nega a supremacia ao bispo de Roma. Que os bispos da África, no sexto Concílio de Cartago, sob a presidência de Aurélio, bispo dessa cidade, admoestavam Celestino, bispo de Roma, por supor-se superior aos demais bispos,enviando-lhes comissionados e introduzindo o orgulho na Igreja. Que, portanto o papado não é instituição divina. Deveis saber meus veneráveis irmãos, que os padres do concílio de Calcedônia colocaram os bispos da antiga e nova Roma na mesma categoria dos demais bispos. Que aquele sexto Concílio de Cartago proibiu o titulo de “Príncipe dos Bispos”, por não haver soberania entre eles. E que São Gregório I escreveu estas palavras, que muito aproveitam a tese: — Quando um Patriarca se intitula “Bispo Universal”, o titulo de Patriarca sofre incontestavelmente descrédito. Quantas desgraças não devemos esperar, se entre os sacerdotes se suscitar tais ambições? Esse “bispo” será o rei dos orgulhosos! — (Pelágio II, Cent. 13). Com tais autoridades e com muitas outras que poderia citar-vos, julgo ter provado que os primeiros bispos de Roma não foram reconhecidos como bispos universais ou papas, nos primeiros séculos do Cristianismo. E, para mais reforçar os meus argumentos, lembrarei aos meus veneráveis irmãos que foi Osio, bispo de Cordova quem presidiu ao primeiro Concílio de Nicéia, redigindo os seus cânones; e que foi ainda esse bispo que, presidindo ao Concílio de Sardica, excluiu o enviado de Julio, bispo de Roma! Mas da direita me citam estas palavras do Cristo — Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja. Sois, portanto chamados para este terreno. Julgais veneráveis irmãos, que a rocha ou pedra sobre que a Santa igreja está edificada, é Pedro; mas permiti que eu discorde desse seu modo de pensar. Diz São Cirilo, no seu quarto livro sobre a Trindade: “A rocha ou pedra de que nos fala Mateus, é a fé imutável dos Apóstolos”. S. Olegário, bispo de Poitiers, em seu segundo livro sobre a Trindade, repete: Que aquela pedra é a rocha da fé confessada da boca de S. Pedro. E no seu sexto livro, mais luz nos fornece, dizendo: É sobre esta rocha da confissão da fé que a Igreja está edificada. S. Jerônimo, no sexto livro sobre S. Mateus, é de opinião que Deus fundou sua Igreja sobre a rocha ou pedra que deu o seu nome a Pedro. Nas mesmas águas navega São Crisóstomo quando, em sua homilia 56 a respeito de Mateus, escreve: — Sobre esta rocha edificarei a minha Igreja: e esta rocha é a confissão de Pedro. E eu vos perguntarei, veneráveis irmãos, qual foi a confissão de Pedro? Já que não me respondeis eu vo-la direi: “Tu és o Cristo, o Filho de Deus”. Ambrósio, o santo Arcebispo de Milão, S. Basílio de Salência e os padres do Concílio de Calcedônia ensinam precisamente a mesma coisa. Entre os doutores da antiguidade cristã, Santo Agostinho ocupa um dos primeiros lugares, pela sua sabedoria e pela sua santidade. Escutai como ele se expressa sobre a primeira Epistola de S. João: Edificarei a minha Igreja sobre esta rocha, significa claramente que é sobre a fé de Pedro. No seu tratado 124, sobre o mesmo S. João, encontra-se esta significativa frase: Sobre esta rocha, que acabais de confessar, edificarei a minha Igreja; e a rocha era o próprio Cristo, filho de Deus. Tanto esse grande e santo bispo não acreditava que a Igreja fosse edificada sobre Pedro, que disse em seu sermão nº 13: — Tu és Pedro, e sobre essa pedra ou rocha que me confessaste, que reconheceste, dizendo: Tu és o Cristo, o filho de Deus vivo; edificarei a minha Igreja, sobre mim mesmo; pois sou o filho do Deus vivo. Edificarei sobre mim mesmo e não sobre ti. Haverá coisa mais clara e positiva? Deveis saber que essa compreensão de Santo Agostinho, sobre tão importante ponto do Evangelho, era a opinião corrente no mundo cristão naqueles tempos. Estou certo de que não me contestareis. Assim é que resumindo vos direi: 1º - Que Jesus deu aos outros Apóstolos o mesmo poder que deu a Pedro. 2º - Que os Apóstolos nunca reconheceram em S. Pedro a qualidade de vigário do Cristo e infalível doutor da Igreja. 3º - Que o mesmo Pedro nunca pensou ser papa, nem fez coisa alguma como papa. 4º - Que os Concílios dos quatro primeiros séculos nunca deram, nem reconheceram o poder e a jurisdição que os bispos de Roma queriam ter. 5º - Que os Santos Padres, na famosa passagem: — Tu és Pedro, e sobre esta pedra (a confissão de Pedro) edificarei minha Igreja — nunca entenderam que a Igreja estava edificada sobre Pedro (super petrum), e sim sobre a rocha (super petram), isto é: sobre a confissão da fé do Apóstolo! Concluo, pois, com a História, a razão, a lógica, o bom senso e a consciência do verdadeiro cristão, que Jesus não deu supremacia alguma a Pedro, e que os bispos de Roma só se constituíram soberanos da Igreja, confiscando, um por um, todos os direitos de episcopado! (Vozes de todos os lados: Silêncio, insolente, silêncio, silêncio!). Não sou insolente! Não, mil vezes não! Contestai a História, se ousais fazê-lo; mas ficai certos de que não a destruireis! Se avancei alguma inverdade, ensinai-me isso com a História, à qual vos prometo fazer a mais honrosa apologia. Mas compreendei que eu não disse tudo quanto quero e posso dizer. Ainda que a fogueira me aguardasse lá fora, eu não me calaria! Sedes pacientes como manda Jesus. Não junteis a cólera ao orgulho que vos domina! Disse Monsenhor Dupanloup, nas suas célebres — Observações — sobre este Concílio do Vaticano, e com razão, que, se declararmos infalível a Pio IX, necessariamente precisamos sustentar que infalíveis também eram os seus antecessores. Porém, veneráveis irmãos, com a História na mão, eu vos provarei que alguns papas faliram. Passo a provar-vos, veneráveis irmãos, com os próprios livros existentes na biblioteca deste Vaticano, como é que faliram alguns papas que nos têm governado: O papa Marcelino entrou no templo de Vesta e ofereceu incenso à deusa do paganismo. Foi, portanto, idólatra; ou pior ainda: foi apostata! Libório consentiu na condenação de Atanásio; depois passou para o Arianismo [3] . Honório aderiu ao Monotelismo [4] . Gregório I chamava Anti-Cristo ao que se impunha como — Bispo Universal; — e, entretanto Bonifácio III conseguiu do parricida Imperador Focas obter esse titulo em 607. Pascoal II e Eugênio III autorizavam os duelos, condenados pelo Cristo; enquanto que Julio II e Pio IV os proibiram. Adriano II, em 872, declarou válido o casamento civil; entretanto, Pio VII, em 1823, condenou-o. Xisto V publicou uma edição da Bíblia e, com uma bula, recomendou a sua leitura; e aquele Pio VII excomungou a edição. Clemente XIV aboliu a Companhia de Jesus, permitida por Paulo III; e o mesmo Pio VII a restabeleceu. Porém, para que mais provas? Pois o nosso Santo Padre Pio IX não acaba de fazer a mesma coisa quando, na sua bula para os trabalhos deste Concílio, dá como revogado tudo quanto se tenha feito em contrário ao que aqui for determinado, ainda mesmo tratando-se de decisões dos seus antecessores? Até isso negareis? Nunca eu acabaria, meus veneráveis irmãos, se me propusesse a apresentar-vos todas as contradições dos papas, em seus ensinamentos. Como então poderá dar-lhes a infalibilidade? Não sabeis que, fazendo infalível Sua Santidade, que presente se acha e me ouve, tereis que negar a sua falibilidade e a de seus antecessores? E vos atrevereis a sustentar que o Espírito Santo vos revelou que a infalibilidade dos papas data apenas deste ano de 1870? Não vos enganeis a vós mesmos: Se decretardes o dogma da infalibilidade papal, vereis os protestantes, nossos rancorosos adversários, penetrarem por larga brecha com a bravura que lhes dá a História. E que tereis vós a opor-lhes? O silêncio, se não quiserdes desmoralizar-vos. (Gritos: É demais; basta, basta!). Não griteis, Monsenhores! Temer a História, é confessar-vos derrotados! Ainda que pudésseis fazer rolar toda a água do Tibre sobre ela, não borraríeis nem uma só das suas páginas! Deixai-me falar e serei breve. Vergílio comprou o papado de Belisário, tenente do Imperador Justiniano. Por isso, foi condenado no segundo Concílio de Calcedônia, que estabeleceu este cânone: — O bispo que se eleve por dinheiro será degradado. Sem respeito àquele cânone, Eugênio III, seis séculos depois, fez o mesmo que Vergílio, e foi repreendido por São Bernardo, que era a estrela brilhante do seu tempo. Deveis conhecer a história do papa Formoso; Estevão XI fez exumar o seu corpo, com as vestes pontificiais; mandou cortar-lhe os dedos e o arrojou ao Tibre. Estevão foi envenenado; e tanto Romano como João, seus sucessores, reabilitaram a memória de Formoso. Lede Plotino, lede Barônio, o Cardeal! É dele que me sirvo. Barônio chega a dizer que as poderosas cortesãs vendiam, trocavam e até mesmo se apoderavam dos bispados; e, horrível é dizê-lo, faziam papas os seus amantes! Genebrado sustenta que, durante 150 anos, os papas, em vez de apóstolos, foram apóstatas. Deveis saber que o papa João XII foi eleito com a idade de dezoito anos tão somente; e que o seu antecessor era filho do Papa Sérgio com Marózzia. Que Alexandre VI era, nem me atrevo a dizer o que ele era de Lucrécia; e que João XXII negou a imortalidade da alma, sendo deposto pelo Concílio de Constança. Já nem falo dos cismas que tanto têm desonrado a Igreja. Volto porém, a dizer-vos que, se decretais a infalibilidade do atual bispo de Roma, devereis decretar também a de todos os seus antecessores; mas, atrever-vos-eis a tanto? (Gritos: Descei da cadeira, descei já; tapemos a boca desse herege). Não griteis, meus veneráveis irmãos, com gritos nunca me convencereis. A História protestará eternamente sobre o monstruoso dogma da infalibilidade papal; e quando mesmo todos vós o aproveis, faltará um voto, e esse voto é o meu! Mas, voltemos à doutrina dos Apóstolos: Fora dela só há erros, trevas e falsas tradições. Tomemos a eles e aos Profetas pelos nossos únicos mestres, sob a chefia de Jesus. Firmes e imóveis como a rocha, constantes e incorruptíveis nas inspiradas Escrituras, digamos ao mundo: Assim como os sábios da Grécia foram vencidos por Paulo, assim a Igreja Romana será também vencida pelo seu 98! (Gritos clamorosos: Abaixo o protestante! Abaixo o calvinista! Abaixo o calvinista! Abaixo o traidor da Igreja!). Os vossos gritos, Monsenhores, não me atemorizam, e só vos comprometem. As minhas palavras têm calor, mas a minha cabeça está serena. Não sou de Lutero, nem de Calvino, nem de Paulo, e sim, e tão somente do Cristo. (Novos gritos: Anátema! Anátema! Anátema vos lançamos!). Anátema! Anátema! Para os que contrariam a doutrina de Jesus! Ficai certos de que os Apóstolos, se aqui comparecessem, vos diriam a mesma coisa que acabo de declarar-vos. Que lhes diríeis vós, se eles, que predicaram e confirmaram com seu sangue, lembrando-vos o que escreveram, vos mostrassem o quanto tendes deturpado o Evangelho do amado Filho de Deus? Acaso lhes diríeis: Preferimos a doutrina dos Loiólas à do Divino Mestre? Não! Mil vezes não! A não ser que tenhais tapado os ouvidos, fechado os olhos e embotado a vossa inteligência, o que não creio. Oh! Se Deus quer castigar-nos, fazendo cair pesadamente a sua mão sobre nós, como fez ao Faraó, não precisa permitir que os soldados de Garibaldi nos expulsem daqui; basta deixar que façais de Pio IX um Deus, como já fizestes uma deusa da Virgem Maria. Evitai, sim, evitai, meus veneráveis irmãos, o terrível precipício a cuja borda estais colocados. Salvai a Igreja do naufrágio que a ameaça, e busquemos todos, nas Sagradas Escrituras, a regra da fé que devemos crer e professar, Digne-se Deus assistir-me. Tenho concluído! (Todos os padres se levantaram, muitos saíram da sala; porém alguns prelados italianos, americanos, alemães, franceses e ingleses rodearam o inspirado orador e, com fraternais apertos de mão, demonstraram concordar com o seu modo de pensar). Coisa singular; desde a tal infalibilidade dos papas, vê-se a Igreja como que atirar-se em um despenhadeiro, de cabeça para baixo! Quão inspirado estava esse bispo Strossmayer! NOTAS: 1. Doutrina e política dos católicos sobretudo franceses que se apoiavam na Cúria Romana (além dos montes), opondo-se aos Galicanos no séc. XVII. O termo passou a significar o sistema e a tendência dos que sustentam a autoridade absoluta do papa em matéria de fé e disciplina como poder centralizado e único. 2. Doutrina surgida em dois momentos históricos: no séc. XIV, defendendo a ingerência dos reis franceses em negócios eclesiásticos; e no séc. XVII, preconizando a autonomia dos bispos franceses em relação a autoridade pontifícia. 3. Doutrina professada por Ário, padre alexandrino do séc. IV, que subordinava o Logos ao Pai, o único eterno e verdadeiro Deus. Foi condenada pelo Concílio de Nicéia (325). O arianismo expediu-se durante todo o século chegando a formar radicais como a dos anomeus. Foi definitivamente eliminado do Império, após numerosas flutuações e tomadas de posição contraditórias. 4. Doutrina Teológica defendida no séc. VII por Sérgio, patriarca de Constantinopla, como desdobramento do monofisismo. Sustentava que Cristo possuía uma única vontade ou energia por causa da unidade de pessoa e de natureza. Foi reprovada pelo 3º Concílio de Constantinopla em 680 - 681.

A VIDA DE MARTINHO LUTERO


 Lutero nasceu em 10 de Novembro de 1483, em Eisleben, na Saxônia Prussiana. Ele morreu na mesma cidade, numa viagem, no dia 18 de Fevereiro de 1546. [Michelangelo nasceu em 1475]. Após a reforma começar, Lutero foi freqüentemente difamado por seus oponentes católicos romanos. Em particular, foi dito que a mãe de Lutero manteve relações sexuais com o diabo e que Martinho era sua prole! Aos 18 anos de idade, ele entrou na Universidade de Erfurt e recebeu seu Bacharel em Artes em 1502 e seu Mestre em Artes em 1505. Seguindo os desejos de seu pai, ele se preparou para a carreira em Direito. Contudo, dois eventos mudaram o curso de sua vida. Primeiro, ele foi abalado pela morte súbita de um amigo íntimo. Segundo, logo após isto, em 2 de Julho de 1505, ele foi pego numa violenta tempestade com trovões perto de Erfurt, e ficou tão aterrorizado que ele caiu no chão e gritou: “Santa Ana, ajude-me e me tornarei monge!” (Ana era a santa padroeira dos mineiros e das pessoas em perigos nas tempestades com trovões). Ele imediatamente se uniu ao convento Agostiniano em Erfurt, para completa consternação de seu pai. Dois irmãos de Lutero morreram de praga bubônica (a morte negra), aproximadamente no tempo em que ele entrou no monastério. Outro irmão (James) sobreviveu e visitou Martinho em Wittenberg, na década de 1530. Além disto, conhecemos muito pouco sobre a sua família. 2. Lutero como um Monge - Lutero foi um piedoso católico romano e adorador da Virgem Maria. Ele tomou para si os mais servis e humilhantes deveres, esperando subjugar o seu orgulho. Ele mendigava nas ruas, lavava o chão, e sujeitava seu corpo a um ascetismo rigoroso e a uma tortura infligidora. Ele estava obcecado para encontrar a paz da salvação, mas repetidamente falhou (uma ansiedade severa da alma a qual ele se referia como Anfechtungen). Ele foi ordenado ao sacerdócio em 2 de Maio de 1507, tempo no qual ele realizou a sua primeira Missa. Sendo instruído pelos seus professores que um sacerdote realmente segurava “seu Deus” em suas mãos e O oferecia aos outros, Lutero duvidou de sua dignidade para realizar tal tarefa. Ele tremeu no altar e teve que ser assistido para completar a cerimônia. O padre confessor de Lutero, no monastério, era um homem chamado Johannes Staupitz, ao qual Lutero mais tarde atribuiu muito dos seus discernimentos teológicos. Lutero freqüentemente ia à Staupitz para confissão, até que o último o admoestou que parasse até que tivesse algo realmente pecaminoso para confessar! 3. Lutero o Professor - Sua carreira de ensino começou em 1508, em Wittenberg. Durante o inverno de 1510-11, ele foi a Roma, uma cidade então cheia de entusiasmo pela Renascença, mas indiferente para com a religião. Lutero ficou apavorado com a incredulidade e imoralidade do papado, uma impressão que indubitavelmente foi instrumental para sua conversão. No seu retorno a casa, ele disse: “Algumas pessoas levam dinheiro a Roma e trazem indulgências de volta. Eu, como um tolo, carreguei cebolas para lá, e trouxe alhos de volta”. Por isto Lutero queria dizer “que ele carregou seu desespero para Roma, esperando ser liberto dele, mas foi embora com um desespero ainda mais profundo” (Thompson, 390). [Michelangelo pinta a Capela Sistina em 1512]. De acordo com o testemunho do seu filho, Paulo (que reivindica ter ouvido isso de seu pai, em 1541), foi durante sua visita a Roma que Lutero subiu de joelhos os 28 degraus da famosa Scala Santa (alegadamente os degraus retirados do Corredor do Julgamento, em Jerusalém), beijando os lugares onde o sangue de Cristo era dito ter caído, tudo isso para assegurar para si mesmo a indulgência adicionada a esta performance ascética, desde os dias do Papa Leão IV, em 850. Repentinamente, abatido pela futilidade de suas ações, se levantou e retornou à Alemanha. Ele recebeu seu doutorado em 1512 e começou a ensinar a Bíblia. De 1513 a 1515, ele ensinou Salmos, e de 1515 a 1517, ele ensinou Romanos, Gálatas e Hebreus. Durante este período, seus sentimentos de extrema imperfeição diante de Deus, foram intensificados. Ele foi assombrado com a compreensão de que um Deus de infinita justiça nunca poderia ser satisfeito com os seus miseráveis esforços em busca da pureza. Após sua conversão, ele recordou dos seus anos como monge e descreveu sua luta: “Eu era um bom monge, e cumpria minhas regras tão estritamente que me aventuro a dizer que, se algum monge entrasse no céu pelo monastério, eu teria conseguido. Todos meus companheiros no monastério que me conheciam, me confirmariam isto. Porque, se eu tivesse ido muito longe, eu teria me martirizado até à morte, com vigílias, orações, leituras e outras tarefas”. “Porque eu esperava que encontraria paz de consciência com jejuns, orações, vigílias, com as quais eu afligia o meu corpo; mas, quanto mais eu me esforçava com coisas como estas, menos paz e tranqüilidade eu conhecia”. “Quanto mais santo, mais incerto eu me tornava”. “Após vigílias, jejuns, orações e outros exercícios de natureza rígida, com os quais, como um monge, eu me afligia quase até à morte, a dúvida ainda era deixada em minha mente, e pensava, Quem sabe que estas coisas são agradáveis a Deus”. [As citações precedentes foram tomadas do livre de Bard Thompson, Humanists and Reformers, 388]. Sua conversão aconteceu em 1516-17, sobre a qual ele escreveu o seguinte: “Ainda que, como monge, eu levasse uma vida irrepreensível, sentia que era um pecador perante Deus, e tinha uma consciência extremamente perturbada. Não podia acreditar que Deus era aplacado com as satisfações que eu lhe dava. Eu não amava, mas sim, odiava a justiça de Deus que pune pecadores e, secretamente, se não com blasfêmia, com certeza murmurando muito, estava irado contra Deus e disse: “Como se não bastasse que miseráveis pecadores, eternamente perdidos por causa do pecador original, sejam esmagados por toda espécie de calamidade pela Lei do Decálogo, Deus tivesse de acrescentar dor em cima de dor pelo Evangelho, e também com o Evangelho nos ameaçando com sua ira justa!” Deste modo, eu me irava, com uma consciência furiosa e perturbada. Todavia, persistentemente golpeava aquela passagem de Paulo, querendo ardentemente entender o que ele quis dizer com “a justiça de Deus”. Finalmente, pela misericórdia de Deus, meditando de dia e de noite, consenti ao contexto das palavras, a saber: “Porque no Evangelho é revelada a justiça de Deus, uma justiça que do princípio ao fim é pela fé, como está escrito: O justo viverá pela fé”. Então comecei a entender [que] a justiça de Deus é aquela pela qual o justo vive por um dom de Deus, em outras palavras, pela fé. E este é o significado: no Evangelho, é revelada a justiça de Deus, isto é, a justiça passiva com a qual [o] Deus misericordioso justifica-nos pela fé, como está escrito: “O justo viverá pela fé”. Foi quando senti como se tivesse nascido de novo e entrado no paraíso por portões abertos. Aqui, me foi mostrada uma face completamente diferente da Escritura. Com base nisso, percorri outra vez, de memória, os textos das Escrituras (...) E, exaltei minha palavra amabilíssima com um amor tão grande quanto o ódio com o qual antes havia odiado “a justiça de Deus”. Portanto, aquela passagem em Paulo tornou-se para mim verdadeiramente o portão para o paraíso (Prefácio aos Escritos em Latim, LW, 34:336-37). Não é necessário dizer que a descoberta de Lutero da graça bíblica e a sua conversão pessoal alteraram radicalmente sua visão sobre o papado Católico Romano. O evangelho, Lutero argumentou, repudia “a ímpia idéia do reinado inteiro do papa, o ensino de que um cristão deve estar incerto sobre a graça de Deus para com ele. Se esta opinião permanece, então, Cristo é completamente inútil...Portanto, o papado é uma verdadeira câmara de tortura de consciências e o próprio reino do diabo” (LW 26:387). B. Lutero Quebra com Roma 1. A Venda de Indulgências: Lutero e Tetzel - Com o intuito de financiar a reconstrução da igreja de São Pedro em Roma, o Papa Julius II e Leão X sancionaram a venda indiscriminada de indulgências. Na linguagem de Roma, indulgentia é um termo para anistia ou remissão de castigo, em particular, a remissão dos castigos temporais (não eternos) pelo pecado, sob a condição de que a pessoa realizasse boas obras específicas e fizesse contribuições financeiras generosas à Roma. Somente Deus pode perdoar o castigo eterno pelo pecado, mas o pecador ainda deve suportar o castigo temporal pelo pecado, seja nesta vida ou no purgatório. Esta última penalidade estava sob o controle do papado e do sacerdócio. Assim, por um preço, a igreja podia reduzir tanto o grau como a duração do castigo no purgatório, tanto para você como para os seus queridos falecidos, que já estão lá. Quem estava na liderança da venda de indulgências na Alemanha era um monge Dominicano, bem conhecedor por sua imoralidade e bebedeira, por nome de Johann Tetzel. Ele começou seu negócio na borda da Saxônia, em Juterbog, poucas horas de Wittenberg. Tetzel era particularmente rude e mercenário em suas táticas. Ele usava frases poéticas para destacar o benefício das indulgências. Por exemplo, “Quando a moeda no cofre soar,A alma do purgatório saltará”. Ele pregava: “Indulgências sãos os mais preciosos e mais nobres dons de Deus...Venham e eu vos darei suas cartas, todas propriamente seladas, pela qual até mesmos os pecados que vocês intentam cometer, podem ser perdoados...Mas muito mais do que isto, as indulgências não beneficiam somente os vivos, mas os mortos também....Padre! Nobre! Comerciante! Esposa! Jovem! Moça! Vocês não ouvem seus pais e seus outros amigos que estão mortos, e que clamam do fundo do abismo: 'Estamos sofrendo tormentos horríveis! Umas esmolas miseráveis nos libertariam; você pode dar, mas não quer!'?”. Era difícil para as pessoas resistirem aos apelos engenhosos de Tetzel, tanto ao egoísmo deles como ao amor pelos pais. A estória diz que após Tetzel ajuntar uma larga soma de dinheiro da venda de indulgências em Leipzig, um homem se aproximou dele e perguntou se ele poderia comprar uma indulgência por um pecado futuro, que ele estava planejando cometer. Tetzel disse que sim, e eles ajustaram o preço. Após isso, o homem atacou e roubou Tetzel, explicando que este era o pecado futuro que ele tinha em mente! Tetzel tinha uma “tabela de preços” para o perdão de pecados: Bruxaria - 2 ducados Poligamia - 6 ducados Assassinato - 8 ducados Sacrilégio - 9 ducados Perjúrio - 9 ducados Lutero perdeu sua paciência quando um bêbado caído no chão lhe mostrou um certificado de indulgência, como garantia para a sua condição inébria. As indulgências podiam também ser obtidas por ver ou venerar certas relíquias. O príncipe de Lutero, Frederico o Sábio, era dono de uma das maiores coleções de relíquia na região, com mais de 19.000 peças, e valendo mais de 1.900.000 dias de indulgência. A coleção de Frederico incluía um pedaço da sarça ardente, ferrugem da fornalha de fogo, leite do seio de Maria, e um pedaço do berço de Jesus, só para citar algumas. A coleção de relíquias do Cardeal Albrecht valia mais de 39.245.120 dias de indulgência. 2. As 95 Teses: 31 de Outubro de 1517 - Enfurecido por estes acontecimentos blasfemos, na tarde de 31 de Outubro de 1517, Lutero publicou na porta do castelo-igreja de Wittenberg, as 95 teses ou proposições sobre o assunto das indulgências e solicitou uma discussão pública sobre o assunto. Houve pouca resposta inicial, mas a rápida circulação das teses (intituladas “Discussão para explicar a Virtude das Indulgências”) certamente instigou as coisas. Schaff escreve isto sobre as teses: “Não houve nenhum protesto contra o Papa e contra a Igreja Romana, ou contra qualquer uma das suas doutrinas, nem mesmo contra as indulgências, mas somente contra o seu abuso. Elas expressamente condenavam aqueles que falavam contra as indulgências (Tese 71), e assumiam que o próprio Papa preferiria ver a Igreja de São Pedro em cinzas, antes do que construí-la com a carne e o sangue de suas ovelhas (Tese 50). Elas implicam uma crença no purgatório. Elas em nenhum lugar mencionam Tetzel. Elas são silentes sobre fé e justificação, que já formavam a essência da teologia e piedade de Lutero. Ele desejava ser moderado, e não tinha a mínima idéia de uma separação da igreja-mãe. Quando as Teses foram publicadas em suas obras selecionadas (1545), ele escreveu no prefácio: Permiti que elas permanecessem para que por elas possa se mostrar quão fraco eu era, e em que estava flutuante de mente estava, quando comecei esta empreitada. Eu era um monge e um papista maluco, e estava tão submerso nos dogmas do Papa, que teria prontamente matado qualquer pessoa que negasse obediência ao Papa”. 3. O Debate de Augsburgo: Lutero e Cajetan (Outubro de 1518) “A história sempre se lembrará da dramática apregoação das teses contra as indulgências em 1517, e o ainda mais dramático confronto em Worms, diante da Igreja e do Estado em 1521, mas o julgamento em Augsburgo foi igualmente dramático e provavelmente mais momentoso do que os outros. Em 1517, virtualmente desconhecido fora de sua Ordem, Lutero estava no chão seguro de sua universidade; em 1521, agora famoso, ele tinha o apoio certo não somente dos eruditos, mas da sociedade –– possivelmente metade da Alemanha. Em 1518, quando partiu para enfrentar Cajetan em Augsburgo, ele era um monge solitário e miserável, que não sabia como a Igreja ou o Império o tratariam, e nem mesmo o que eles fariam com ele durante o seu percurso para lá. Se algum homem já partiu em fé sozinho, Lutero o fez. Amigos influentes o advertiram que nunca lhe seria permitido voltar; Staupitz suplicou para que ele escapasse enquanto podia. Ele respondeu, 'Cristo governa em Augsburgo, mesmo no meio dos Seus inimigos'” (Atkinson, 169). 4. O Debate de Leipzig: Lutero e Eck (27 de Junho - 15 de Julho de 1519) - O colega de Lutero, Andreas Carlstadt (1480-1541), começou o debate, mas foi tristemente vencido. O ponto primário da discussão foi a confissão de Lutero de que tanto o Papa como a Igreja erraram, enquanto que somente a Escritura é infalível. Lutero concluiu seu argumento dessa forma: “Eu lamento que o erudito doutor (Eck) mergulhe na Escritura somente até onde a aranha-da-água mergulha na água –– além disso, ele parece fugir dela assim como o Diabo da Cruz. Eu prefiro, com toda deferência pelos Pais, a autoridade da Escritura, a qual, com isto, recomendo ser o juiz da nossa causa”. A tática final de Eck foi assimilar Lutero com o “herético” Hus que tinha sido queimado na estaca. Inicialmente Lutero negou afinidade com Hus. Contudo, durante um intervalo para almoço (literalmente!), Lutero foi à biblioteca e leu os registros da condenação de Hus, no Concílio de Constância. Quando o debate recomeçou, Lutero admitiu sua simpatia por Hus e sua concordância com muito do que o Boêmio ensinou. [Leonardo da Vinci morre em 1519] 5. Os Panfletos Publicados de Lutero - Durante o período de Julho a Outubro de 1520, Lutero escreveu suas 3 obras mais eficazes. Em Address to the German Nobility [Discurso à Nobreza Alemã] ele ataca três muralhas do edifício Católico Romano: a reivindicação de que o poder espiritual da Igreja Católica Romana era superior ao poder temporal dos reis e príncipes; a reivindicação de que ninguém poderia interpretar a Escritura, senão o Papa; a reivindicação de que somente o Papa poderia intimar um concílio geral. Ele também criticou o conceito do celibato sacerdotal. Lutero disse: o papa não tem poder para ordenar o celibato mais do que o “tem para proibir o se alimentar, o beber, o movimento natural do estômago, ou o engordar”. No The Babylonian Captivity of the Church [Cativeiro Babilônico da Igreja], Lutero atacou o sistema sacramental Católico Romano e em seu On the Freedom of the Christian Man [Sobre a Liberdade do Homem Cristão] ele fala das liberdades do crente, tanto em relação aos assuntos espirituais como em relação à autoridade do estado. 6. Exsurge Domine: a Bula de Excomunhão (15 de Junho de 1520) - Este decreto papal excomungou Lutero, exigiu a queima de seus livros, e condenou toda a Reforma. Lutero respondeu jogando o documento no fogo (10 de Dezembro de 1520), quando ele disse estas palavras: “Como tu (o Papa] tens atormentado a Santa Palavra do Senhor, possa o fogo eterno te atormentar!”. “Um tremor se espalhou pela Europa quando essa ficou sabendo que um monge obscuro, um homem que não tinha nada além de sua fé em Deus, queimou uma bula papal. Foi o sinal ardente de emancipação. A alma individual tinha descoberto seu verdadeiro valor. Se a Reforma pode ser datada, esta data deve ser 10 de Dezembro de 1520. Se eras podem ser datadas, nossa era moderna começou às nove horas daquela manhã” (Atkinson, 197). 7. A Dieta de Worms (1521) - Lutero apareceu diante da dieta no dia 17 de Abril, às 16:00h, onde ele estava para se defender diante de Charles V, Santo Imperador Romano (então com apenas 19 anos de idade). Charles disse: “É ridículo que um único monge possa estar certo em sua opinião e toda a Cristandade em erro por mil anos ou mais”. Ele respondeu duas perguntas. Primeiro, ele reconheceu que os livros sobre a mesa diante dele eram seus. Em segundo lugar, foi lhe perguntado se ele afirmaria ou retrataria o que tinha escrito. Lutero pediu um tempo para refletir e orar antes de responder, e foi lhe dado 24 horas. Aqui está o texto de sua resposta: “Eu não posso negar que os livros mencionados são meus, e nunca negaria qualquer um deles: eles são minha prole; e escrevi alguns outros que não foram mencionados. Mas, quanto à pergunta, se reafirmarei tudo nos mesmos termos, ou se retratarei o que expressei além da autoridade da Escritura, –– pois o assunto envolve a questão da fé e da salvação das almas, e porque ela diz respeito à Palavra de Deus, que é a maior coisa no céu e na terra, e a qual todos devemos reverenciar, –– seria perigoso e imprudente para eu fazer qualquer declaração não premeditada, pois na fala não premeditada eu posso dizer algo menor do que o fato e algo maior do que a verdade; além do mais, lembro do dito de Cristo, quando declarou, 'Qualquer que me negar diante dos homens, eu o negarei também diante de meu Pai, que está nos céus, e diante dos Seus anjos'. Por estas razões, imploro, com todo respeito, que vossa Majestade Imperial, me dê tempo para deliberar, para que eu possa responder a pergunta sem injúria à Palavra de Deus e sem perigo para minha própria alma”. Retornando no dia 18 de Abril, às 6:00h da manhã, ele entregou esta agora famosa resposta: “A menos que possa ser refutado e convencido pelo testemunho da Escritura e por claros argumentos (visto que não creio no Papa, nem nos concílios; é evidente que todos eles freqüentemente erram e se contradizem); estou conquistado pela Santa Escritura citada por mim, minha consciência está cativa à Palavra de Deus: não posso e não me retratarei, pois é inseguro e perigoso fazer algo contra a consciência. Esta é a minha posição. Não posso agir de outra maneira. Que Deus me ajude. Amém!”. Lutero deixou Worms imediatamente, e no dia seguinte foi denunciado pelo Imperador como “um herético notório”, que devia ser silenciado. Lutero foi chamado de um criminoso que cometeu alta traição e, conseqüentemente, recebeu uma sentença de morte. No dia 26 de Maio de 1521, o Imperador emitiu este decreto: “Ordenamos que nenhum de vocês tome o supracitado Martinho Lutero em suas casas, não o recebam em corte, e nem lhe dêem comida nem bebida, nem o escondam, que não lhe proporcionem nenhuma ajuda, favor, apoio, ou encorajamento, nem clandestinamente ou em público, através de palavras ou atos. Onde o puderem pegar, prendam-no e o dominem, capturem-no e o enviem a nós sob segurança máxima”. Sobre qual seria a importância da Dieta de Worms, um autor respondeu: “A Dieta de Worms, o aparecimento de Lutero ali, em 17 de Abril de 1521, pode ser considerado como a maior cena na história moderna da Europa; foi realmente o ponto à partir do qual toda a história subseqüente da civilização se ergueu. De um lado, a pompa e o poder do mundo estavam ali; do outro, de pé, em favor da verdade de Deus, um homem, o filho do pobre mineiro Hans Lutero. Nossa petição –– a petição do mundo inteiro a ele, era: Liberta-nos; está nas tuas mãos; não nos abandone. Lutero não nos abandonou. Este foi, como dizemos, o maior momento na história moderna dos homens –– o Puritanismo Inglês, a Inglaterra e os seus Parlamentos, a vasta obra da América nestes dois séculos; a Revolução Francesa; a Europa e a sua obra por todas as partes no presente –– o germe de todos estes descansa ali. Tivesse Lutero agido de outra maneira naquele momento e tudo o mais seria de outra forma. (Thomas Carlyle, como citado em P. C. Croll, ed., Tributes to the Memory of Martin Luther [Philadelphia: G. W. Frederick, 1884], pp. 49-50). 8. O Exílio de Lutero no Castelo de Wartburg (1521-22) - Frederico “o Sábio”, o governador civil de Lutero, arranjou seu “seqüestro” durante a viagem de volta à Wittenberg. Ele foi levado para o Castelo Wartburg, em Turíngia [região sul da atual Alemanha], e permaneceu ali por dois anos. Durante este tempo foi proibida a leitura dos seus livros e uma recompensa pela sua captura foi anunciada. O próprio Lutero estava ativo, traduzindo o Novo Testamento para o Alemão. C. O Desenvolvimento do Movimento Luterano 1. Radicalismo Protestante: Carlstadt, os Profetas Zwickaus, e Thomas Munzer - Enquanto no exílio em Wartburg, dois dos discípulos de Lutero foram deixados a cargo dos assuntos em Wittenburg: Philip Melancthon e Carlstadt, sendo que o último impôs a sua própria liderança. Thompson explica: “Por volta do Natal de 1521, o berço da Reforma estava engolfado numa iconoclastia selvagem, sob a administração de Carlstadt. A Missa Católica foi destruída e refeita. Monges e freiras saíam dos conventos e se casavam. As igrejas e capelas monásticas foram cenas de profanação. No meio do tumulto, os Profetas de Zwickau chegaram; eram três profetas [Nicholas Storch, Thomas Drechsel, Marcus Thomae], assim chamados por terem sido expulsos recentemente da cidade de Zwickau. Eles eram entusiastas no sentido técnico da palavra; isto é, eles professavam ter recebido novas revelações de Deus, totalmente aparte da Bíblia, cuja relevância excedia àquelas da Bíblia. Eles então começaram a ridicularizar Martinho Lutero por sua dependência escrava às Escrituras. Eles insultavam: 'Bíblia, Babel, Bobo', zombando do interesse bíblico de Lutero” (Thompson, 405-06). De acordo com Lindberg, os três homens “chegaram a Wittenberg logo após o Natal, reivindicando sonhos e visões divinamente inspirados de uma invasão turca, a eliminação de todos sacerdotes e o eminente fim do mundo. Eles mais adiante reivindicaram que as pessoas deveriam ser ensinadas somente pelo Espírito Santo, sem nenhuma conexão com Cristo e a Bíblia” (The European Reformations, 104). Munzer (1489-1525) também reivindicou revelação extra-bíblica de uma forma que minava a autoridade da Escritura. De acordo com Munzer, a verdadeira e viva palavra de Deus deve ser ouvida diretamente da boca de Deus, e não indiretamente de algum livro, nem mesmo da Bíblia. Ele apelou para uma Palavra Interior para justificar a crença de que os últimos dias estavam às portas e que a igreja deveria levantar as armas, tanto contra as autoridades civis como contra o papado medieval. Lutero, disse ele, “não sabe nada sobre Deus, embora ele possa ter engolido cem bíblias”. Ao que Lutero replicou: “Eu não teria escutado Thomas Munzer, mesmo que ele tivesse engolido o Espírito Santo, as penas e tudo mais!”. Lindberg identifica a principal diferença teológica entre os dois. Na teologia de Munzer, “A sola scriptura é deslocada pela sola experientia. A fé escriturística é uma fé morte que adora um Deus mudo. O Deus que fala é o Deus que é experimentado diretamente no coração. Numa carta enviada a Melancthon, datada de 29 de Março de 1522, Munzer escreveu: 'O que eu desaprovo é isto: que é um Deus mudo que vocês adoram....Não só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus; note que ela sai da boca de Deus, e não de livros” (151). 2. A quebra de Lutero com Erasmo e os Humanistas - Sobre o Cativeiro da Vontade (De Servo Arbitrio). 3. Lutero e a Guerra dos Camponeses (1523-25) - Camponeses decepcionados e privados dos direitos de cidadania apelaram à ênfase de Lutero sobre a liberdade do cristão para justificar uma revolta armada. Lutero se opôs a rebelião deles, mas mesmo assim, no final das contas, mais de 100.00 morreram na batalha. Thomas Munzer se uniu com uns 7.000 camponeses em Frankenhausen, dos quais mais de 6.000 foram exterminados. Munzer fugiu, mas foi mais tarde captuado, torturado, executado e teve sua cabeça empalaad, como uma advertência para todos ver. 4. O Casamento de Lutero (1525) - Katherine von Bora (1499-1552) escapou de um monastério com várias outras freiras em Abril de 1523. Ela e Lutero casaram em 13 de Junho de 1525. 5. A Primeira Dieta de Speier (1526) - O princípio: cuius regio, eius religio, que traduzido livremente significa que o príncipe que governa o território determina a religião dentro dele (literalmente, De quem é a região, sua é a religião). 6. A Segunda Dieta de Speier (1529) - Esta foi um cancelamento dos ganhos feitos em 1526 na Primeira Dieta. A Igreja Católica Romana foi a única declarada legal e todos os esforços para uma reforma posterior foram condenados com a dor da excomunhão e até mesmo da morte. Os membros luteranos da Dieta emitiram um Protesto (23 de Abril de 1529; por conseguinte, o nome Protestante) contra todas aquelas medidas, que eram contrárias tanto às Escritura como às decisões da Dieta de 1526. 7. Lutero, Zuínglio, e o Colóquio de Marburgo (1529) - Mais sobre isto é encontrado no meu artigo sobre Zuínglio. Aqui, simplesmente observaremos que Lutero e Zuínglio concordaram em 14 dos 15 assuntos teológicos. O único ponto divisor foi a natureza da “presença” de Cristo nos elementos da Ceia do Senhor. Sua falha em concordar impediu a unificação religiosa entre Alemanha e Suíça, tão desejada por Filipe de Hesse. 8. A Dieta de Augsburgo e a Confissão de Augsburgo (1530) 9. A Liga de Schmalkaldic (1531) 10. As Guerras de Schmalkaldic (1546-52) 11. A Paz de Augsburgo (1555)